sábado, 13 de abril de 2024

A origem da rivalidade entre Israel e Irã e como ela está sendo intensificada pela guerra em Gaza




Partidários do Hezbolá protestam contra Israel em Beirute

CRÉDITO,MANU BRABO / GETTY

Legenda da foto,A inimizade entre o Irã e Israel tornou-se uma das principais fontes de instabilidade no Oriente Médio

*Esta reportagem foi publicada originalmente em 8/4 e atualizada em 13/4

A escalada bélica no Oriente Médio teve um grande desenvolvimento com um ataque de drones lançado pelo Irã contra Israel.

Forças de Defesa de Israel anunciaram no sábado (13/4) que o ataque estava em curso e disseram que as forças israelenses estavam em alerta máximo e “monitorando todos os alvos”.

O ataque era esperado - o Irã havia prometido uma resposta após vários de seus altos comandantes militares morrerem em um ataque contra o consulado do país em Damasco, atribuído a Israel




Além disso, o Exército suspendeu todas as dispensas de soldados, e os serviços de GPS foram bloqueados para atrapalhar a navegação de drones e mísseis intrusos.

Esse é o mais recente episódio de uma inimizade já antiga.

Israel e Irã estão há anos em uma rivalidade sangrenta que virou uma das principais fontes de instabilidade no Oriente Médio e cuja intensidade varia de acordo com o momento geopolítico.

Para Teerã, Israel não tem o direito de existir. Os governantes iranianos consideram o país o "pequeno Satanás", o aliado no Oriente Médio dos Estados Unidos, que chamam de "grande Satanás", e querem que ambos desapareçam da região.

Já Israel acusa o Irã de financiar grupos "terroristas" e de realizar ataques contra seus interesses, movidos pelo antissemitismo dos aiatolás.

A rivalidade entre os "arqui-inimigos" já fez um grande número de mortos, muitas vezes em ações secretas em que nenhum dos governos admite sua responsabilidade.

E a guerra em Gaza só fez as coisas piorarem.

Soldados e homens armados, montam guarda junto a um edifício de Teerã com um pôster de Khomeini colado no fundo

CRÉDITO,GETTY IMAGES

Legenda da foto,O triunfo da Revolução Islâmica de 1979 no Irã marcou o início da rejeição iraniana a Israel

Como começou a rivalidade entre Israel e Irã

As relações entre Israel e o Irã foram bastante cordiais até 1979, quando a chamada Revolução Islâmica dos aiatolás conquistou o poder em Teerã.

E embora tenha se oposto ao plano de fatiamento da Palestina que resultou na criação do Estado de Israel em 1948, o Irã foi o segundo país islâmico a reconhecer Israel, depois do Egito.

O Irã era uma monarquia na qual reinavam os xás da dinastia Pahlavi e um dos principais aliados dos Estados Unidos no Oriente Médio. Assim, o fundador de Israel e seu primeiro chefe de governo, David Ben-Gurion, procurou e conseguiu a amizade iraniana como forma de combater a rejeição do novo Estado judeu de seus vizinhos árabes.

Mas a Revolução de Ruhollah Khomeini, em 1979, derrubou o xá e impôs uma república islâmica que se apresentava como defensora dos oprimidos e tinha como principais marcas a rejeição ao "imperialismo" americano e a Israel.

Ruhollah Khomeini cumprimenta a multidão em Teerã

CRÉDITO,GETTY IMAGES

Legenda da foto,Khomeini e outros líderes da Revolução Islâmica simpatizavam com a causa dos palestinos contra Israel

O novo regime dos aiatolás rompeu as relações com Israel, deixou de reconhecer a validade do passaporte de seus cidadãos e tomou posse da embaixada israelense em Teerã para cedê-la à Organização para a Libertação da Palestina (OLP), que então liderava a luta por um Estado palestino, contra o governo israelense.

Alí Vaez, diretor do Programa para o Irã do International Crisis Group, um centro de análise, disse à BBC Mundo que "a aversão a Israel foi um pilar do novo regime iraniano porque muitos de seus líderes haviam treinado e participado de ações de guerrilha com palestinos em lugares como o Líbano e tinham uma grande simpatia por eles".

Mas além disso, acredita Vaez, "o novo Irã queria se projetar como uma potência pan-islâmica e levantou a causa palestina contra Israel, que os países muçulmanos árabes tinham abandonado".

Assim, Khomeini começou a reivindicar a causa palestina como sua própria. E grandes manifestações pró-Palestina, com apoio oficial, tornaram-se habituais em Teerã


Homens queimam bandeiras israelenses em manifestação em Teerã

CRÉDITO,GETTY IMAGES

Legenda da foto,As manifestações contra Israel tornaram-se habituais em Teerã

Vaez explica que "em Israel a hostilidade ao Irã só começou mais tarde, na década de 1990, porque antes o Iraque de Saddam Hussein era percebido como uma maior ameaça regional."

Tanto é que o governo israelense foi um dos mediadores que tornou possível o chamado Irã-Contra, o programa pelo qual os Estados Unidos desviaram armamento para o Irã, para que usassem na guerra contra o vizinho Iraque, entre 1980 e 1988.

Mas, com o tempo, Israel começou a ver no Irã um dos principais perigos para sua existência. E a rivalidade entre os dois passou das palavras para os fatos.

Uma 'guerra nas sombras'

Vaez observa que, enfrentando também a Arábia Saudita, outra grande potência regional, e consciente de que o Irã é persa e xiita em um mundo islâmico maioritariamente sunita e árabe, "o regime iraniano percebeu seu isolamento e começou a desenvolver uma estratégia destinada a evitar que seus inimigos pudessem um dia atacá-lo em seu próprio território".

Assim, proliferou uma rede de organizações alinhadas a Teerã que realizavam ações armadas favoráveis aos seus interesses. A libanesa Hezbollah, listada como terrorista pelos Estados Unidos e pela União Europeia, é a mais proeminente. Hoje, o chamado "Eixo da Resistência" iraniano se estende pelo Líbano, Síria, Iraque e Iêmen.

Israel não ficou de braços cruzados e trocou com o Irã e seus aliados ataques e outras ações hostis, muitas vezes em outros países, onde financia e apoia grupos armados que combatem os pró-iranianos.

O estado da relação entre o Irã e Israel foi descrito como uma "guerra nas sombras", na qual ambos já realizaram ataques mútuos sem que, em muitos casos, nenhum dos governos tenha admitido oficialmente sua participação.

Em 1992 o grupo Jihad Islâmico, próximo ao Irã, atacou a embaixada israelense em Buenos Aires, provocando 29 mortes. Pouco antes, o líder do Hezbollah, Abbas al-Musawi, tinha sido assassinado, em um atentado amplamente atribuído aos serviços de inteligência de Israel.

Para Israel, sempre foi uma obsessão minar o programa nuclear iraniano e evitar que chegue o dia em que os aiatolás tenham armas nucleares.

Em Israel não se acredita que o programa nuclear iraniano tenha apenas fins civis. E é amplamente aceito que foram os serviços israelenses que, em colaboração com os Estados Unidos, desenvolveram o vírus de computador Stuxnet, que causou sérios danos às instalações nucleares iranianas na primeira década de 2000.

Um guarda de segurança monta guarda ao lado do reator nuclear de Bushehr, no Irã.

CRÉDITO,GETTY IMAGES

Legenda da foto,Um segurança monta guarda ao lado do reator nuclear de Bushehr, no Irã.

Teerã também denunciou a inteligência israelense como responsável pelos atentados contra alguns dos principais cientistas encarregados de seu programa nuclear.

O caso mais conhecedo foi o assassinato em 2020 de Mohsen Fakhrizadeh, considerado o principal responsável pelo programa. Mas o governo israelense nunca aceitou seu envolvimento nas mortes de cientistas iranianos.

Israel, juntamente com seus aliados ocidentais, acusam o Irã de estar por trás dos ataques com drones e foguetes sofridos por seu território, bem como de ter realizado vários ataques cibernéticos.

Outro motivo de confronto foi a guerra civil desencadeada na Síria a partir de 2011. A inteligência ocidental aponta que o Irã enviou dinheiro, armas e instrutores para apoiar as forças do presidente Bashar Al-Assad contra os insurgentes que tentavam derrubá-lo. Isso disparou o alerta em Israel, que acredita que a vizinha Síria é uma das principais rotas por onde os iranianos enviam armamentos e equipamentos para o Hezbollah no Líbano.

De acordo com o portal de inteligência americano Stratfor, tanto Israel quanto o Irã realizaram ações na Síria destinadas a dissuadir o outro de lançar um ataque em larga escala.

Em 2021, a "guerra nas sombras" chegou ao mar quando Israel apontou o Irã como responsável pelos ataques contra navios israelenses no Golfo de Omã. E o Irã, por sua vez, acusou Israel de atacar seus navios no Mar Vermelho.

Soldados iranianos ajoelhados diante do caixão do responsável pelo programa nuclear de Teerã

CRÉDITO,HAMED MALEKPOUR / GETTY

Legenda da foto,O Irã acusa Israel de ser responsável pelo assassinato do chefe de seu programa nuclear

Como estão as coisas agora

Desde os ataques de 7 de outubro de 2023 realizados pelo Hamas contra Israel, e a ofensiva militar massiva lançada pelo Exército israelense em Gaza em resposta, analistas e governos de todo o mundo expressam preocupação de que o conflito pudesse provocar uma reação em cadeia na região, e um confronto aberto e direto entre iranianos e israelenses.

Os conflitos entre forças israelenses e milicianos supostamente ligados ao Hezbollah na fronteira com o Líbano aumentaram nos últimos meses. Os choques com manifestantes palestinos nos territórios ocupados da Cisjordânia também.

Até os mais recentes desenvolvimentos, tanto Irã quanto Israel vinham evitando elevar a hostilidade e os combates em grande escala.

Um tanque israelense avança em Gaza

CRÉDITO,MENAHEM KAHANA / GETTY

Legenda da foto,A ofensiva israelense em Gaza reativou a hostilidade entre Israel e o Irã

Para Vaez, “a ironia é que ninguém quer um conflito em grande escala agora. Israel está há seis meses em sua devastadora guerra contra o Hamas em Gaza, que afetou muito negativamente sua reputação no cenário internacional e o deixou mais isolado do que nunca. Com essa missão ainda por concluir, ela teria que encarar o Irã, que é um ator estatal e, portanto, muito mais poderoso do que o Hamas".

"O Irã, por sua vez, tem muitos problemas econômicos e seu governo sofre uma crise de legitimidade interna", depois de meses de protestos liderados por mulheres, fartas de restrições religiosas.

Assim, o país também não está nas melhores condições para se colocar contra uma potência militar como Israel, que conta com o apoio dos EUA em caso de guerra declarada.

Os escombros do consulado iraniano em Damasco

CRÉDITO,AMMAR GHALI / GETTY

Legenda da foto,O ataque ao seu consulado em Damasco, no qual vários generais morreram, enfureceu o Irã

Mas o ataque à sua sede diplomática em Damasco, que deixou 13 mortos, incluindo alguns dos mais proeminentes altos comandantes iranianos, como o general da Guarda Revolucionária Mohammad Reza Zahedi e seu adjunto, Hadi Hajriahimi, bateu forte em Teerã.

O Ministério das Relações Exteriores iraniano prometeu "um castigo ao agressor" e seu embaixador na Síria, Hossein Akbari, anunciou que a resposta seria "decisiva".

Com o ataque lançado por Teerã contra o território Israelense, a situação se agrava e está evoluindo rapidamente, com os governos de todo o Médio Oriente reagindo às notícias dos ataques de drones.

A Jordânia, o Líbano e o Iraque, três países localizados na provável trajetória de voo destes drones, fecharam o seu espaço aéreo.

O Irã e Israel também fecharam os seus para todos, exceto aeronaves militares



BBC BRASIL  
  • Guillermo D. Olmo
  • Role,BBC News Mundo

Professor Edgar Bom Jardim - PE

terça-feira, 9 de abril de 2024

A dificuldade dos brasileiros de encontrar trabalho depois dos 50 anos: 'Pessoas nos julgam como inferiores'




Homem de cabelo branco sentado aguardando ao lado de cadeiras vazias

CRÉDITO,GETTY IMAGES

  • Author,Priscila Carvalho
  • Role,Do Rio de Janeiro para a BBC News Brasil

Desempregada há um ano, a publicitária e designer gráfica Sibele Monice, de 57 anos, vive o que muitos brasileiros enfrentam nesta faixa etária: a dificuldade de encontrar emprego.

Desde a sua demissão, em fevereiro do ano passado, ela conta que conseguir vagas de trabalho com carteira assinada está cada vez mais raro.

Além do alto salário que ganhava em sua última empresa, a publicitária atribui a dificuldade de uma recolocação ao etarismo (preconceito contra a idade) por parte das organizações.

"Sinto que há esse preconceito e o etarismo tanto no mercado de trabalho quanto nas redes sociais. As pessoas acreditam que quem tem 50+ parou no tempo, mas isso não é verdade", diz


A profissional já chegou a ouvir que era muito qualificada para vaga, que seu currículo impressionava, mas que não podiam pagar o que ela valia.

Sibele Monice

CRÉDITO,ARQUIVO PESSOAL

Legenda da foto,'As pessoas acreditam que quem tem 50+ parou no tempo, mas isso não é verdade', diz Sibele Monice

De fato, a dificuldade para o público a partir de certa faixa etária encontrar um trabalho é uma realidade no Brasil.

Uma pesquisa realizada no meio do ano passado, pelas companhias Robert Half e Labora, que atuam na área de recrutamento e inovação, mostra que cerca de 70% das empresas contrataram muito pouco ou nenhum profissional com mais de 50 anos. Na prática, isso representa 5% das novas contratações.

Feito com mais 258 empresas, o estudo aponta ainda que cerca de 80% dessas organizações ainda não "estabeleceram métricas para avaliar o sucesso de suas iniciativas de inclusão da diversidade geracional".

desemprego nessa idade chama ainda mais atenção, segundo os últimos números divulgados pela empresa IDados, consultoria especializada em análise de dados e soluções para aumentar o impacto e produtividade de empresas, organizações públicas e do terceiro setor.

De acordo com a entidade, em 2012, o número de desempregados acima de 50 anos era de 508,9 mil pessoas. Atualmente, eles já são aproximadamente 1,4 milhão de pessoas em busca de oportunidade de trabalho.

Eles querem e precisam trabalhar

Com a inversão da pirâmide etária no Brasil e prolongamento da expectativa de vida da população, é cada vez mais comum ver pessoas mais velhas trabalhando.

E se antes havia a ideia de que o país era formado por maioria jovem, esse cenário mudou, reforça Maria José Tonelli, professora no departamento de Administração Geral e Recursos Humanos na FGV-EAESP.

"As empresas não se dão conta que a população brasileira está envelhecendo, embora os dados sejam evidentes", diz a especialista.

Essa transição também foi percebida em relação à aposentadoria, tanto no Brasil quanto no exterior. "Nós tínhamos socialmente um modelo de que as pessoas chegavam nos 50 e 60 e tinham que se aposentar, mas isso não é mais factível", destaca Tonelli.

Sibele concorda e ressalta que, mesmo tendo quase 60 anos, ainda precisa trabalhar e não pensa em se aposentar por enquanto. Com dificuldade em arranjar alguma vaga CLT — o regime celetista —, ela segue trabalhando como freelancer.

No entanto, até para vagas temporárias, a designer afirma que encontra uma certa resistência de quem contrata, mesmo que seja de forma velada.

"A gente passa uma vida se desenvolvendo para encontrar pessoas que nos julgam incapazes ou inferiores, por conta da idade. É triste e desafiador ao mesmo tempo", diz.

A aposentada Maria Aparecida de Oliveira tem 63 anos e afirma que está mais difícil encontrar trabalho na área financeira, posição que atuou por anos, até se aposentar pela iniciativa privada.

"Quero aumentar a minha renda e estou procurando trabalho há mais ou menos seis meses", diz.

Mesmo não sofrendo um preconceito direto pela idade, ela diz que, atualmente, só se depara com vagas de trabalho para atuar como atendente de telemarketing ou demonstradora de produtos de supermercado.

Segundo a professora da FGV, para que pessoas mais velhas voltem para o mercado de trabalho e ainda atuem na área de formação, é necessário desmistificar os estereótipos que essa população sofre. "É preciso vencer esse marcador social que é a idade", afirma.

Preconceito inconsciente

Embora seja contra a lei colocar um limitador de idade em anúncios de contratações de trabalho, as empresas podem fazer isso de forma indireta.

Assim como a sociedade, muitas companhias podem reproduzir etarismo de forma inconsciente nos processos seletivos, segundo os especialistas.

Para mudar esse cenário, é necessário criar políticas eficientes, desde as primeiras etapas da entrevista.

"Quando olhamos para as empresas, temos que ter um olhar da prática empresarial. A empresa tem políticas concretas sobre esse assunto ou é algo que só fica no dia a dia", indaga Miriam Rodrigues , professora do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).

Eliminar um candidato simplesmente pela idade deve ser algo impensável e uma prática condenável nas organizações, segundo Rodrigues.

"Qualquer aspecto que seja discriminatório, a gente já coloca um carimbo. Competência não tem carimbo de validade", diz a professora do Mackenzie.

Outro aspecto que precisa ser levado em consideração na hora das contratações, é, de fato, a qualificação daquele profissional e não a idade.

Quando questionado se sabe mexer com tecnologia, por exemplo, qual o tipo de ferramenta o contratante quer que o candidato saiba para determinada função de trabalho.

"As tecnologias mudam com uma velocidade absurda. Pressupor que ele não está atualizado apenas pela idade dele é um preconceito imenso", diz.

Em alguns casos, a maneira mais fácil de avaliar uma pessoa para determinado cargo é por meio de testes práticos, que realmente permitam ao profissional demonstrar seu conhecimento.

Mulheres 50+ sofrem mais para conseguir emprego

A questão de gênero também é um forte indicativo quando falamos de desemprego entre pessoas acima dos 50 anos. No caso das mulheres, a dificuldade para uma recolocação se inicia até antes dessa idade.

"As mulheres começam a perceber o envelhecimento delas na força de trabalho aos 40 anos de idade", afirma Tonelli.

Há, ainda, uma cobrança excessiva em relação à aparência da mulher que, muitas vezes, não ocorre da mesma forma com os homens. Esse estigma social, segundo Tonelli, se reflete constantemente no mercado de trabalho.

"Se a mulher deixa o cabelo branco é vista como desleixada. Mas os homens que ficam com cabelo branco não são vistos com preconceito. Neles, isso significa experiência."

Ainda de acordo com o estudo da Robert Half e Labora, os profissionais desta faixa etária, que ainda atuam no mercado, são em sua maioria brancos e homens.

O levantamento também apontou que das 258 empresas que participaram da pesquisa, 36,47% afirmou que tem menos de 5% de mulheres 50+ no quadro de funcionários. Já 9% das empresas que responderam não tinham nenhuma mulher 50+.

De acordo com especialistas, esses efeitos são ainda mais intensos no caso de mulheres pretas, que também precisam lidar com questões misóginas e racistas.

"A hora que a gente pega todas as interseccionalidades, uma mulher preta 50+, tem mais desafios ainda para combater todos os ismos", destaca Andrea Tenuta, head de novos negócios da Maturi, empresa que atua na capacitação de pessoas com mais de 50 anos.

Ela ainda acrescenta que incentivar a educação e o letramento sobre o assunto não tem a ver só com o combate ao etarismo, mas, também, com as interseccionalidades.

A problemática se estende também à população LGBTQIAP+, que sofre com preconceitos diários e tem uma baixa expectativa de vida no Brasil.

"Os grupos de diversidade, os grupos sub-representados no mercado de trabalho, sofrem mais quando tem aí essa sobreposição dessas identidades", diz Tenuta.

Sete meses para conseguir uma vaga

Selma Dias

CRÉDITO,ARQUIVO PESSOAL

Legenda da foto,Selma conta que chegou a ser questionada por dois jovens se sabia o que era tecnologia durante uma entrevista de emprego

Em dezembro do ano passado, a executiva de relacionamento com o cliente, Selma Dias, de 56 anos, conseguiu se recolocar em sua área.

Mas o processo foi bem difícil, segundo ela. Foram muitas entrevistas, currículos enviados, rede de networking acionada, mas demorou sete meses até conseguir voltar ao mercado de trabalho.

"Nunca me disseram diretamente sobre a idade, porém,os feedbacks indiretos eram muitos", diz.

Para Selma, o principal entrave durante o tempo em que ficou desempregada foi, justamente, conseguir uma entrevista.

Uma vez, durante uma entrevista de emprego, chegou a ser questionada por dois jovens se sabia o que era tecnologia. "Naquele momento, encerrei a entrevista.Só mostra o despreparo até para entrevistas de empregos de pessoas 50+", diz, indignada.

Mesmo tendo 25 anos de experiência em liderança no atendimento ao cliente e trabalhando em locais conceituados, encontrar empresas que eram abertas à diversidade, foi muito custoso.

Sempre que chegava ao final de um processo seletivo, com o gestor da vaga, Selma não era aprovada, e não recebia um retorno claro.

Na visão dela, a recusa ocorria pelo fato de que alguns líderes se sentiam ameaçados por ter uma pessoa mais experiente, e não levavam em consideração a ideia de ter um profissional que agregasse valor.

"Minha percepção, durante essa fase de transição, é que o preconceito ocorre mais pelos líderes requisitantes das vagas, do que pela área de RH", diz.

Hoje, trabalhando há quase três meses em uma nova companhia, ela conta que tem esperança de que o olhar para o profissional 50+ mude.

"Atualmente, estou trabalhando em uma empresa de serviços que se diferencia por realmente ser aberta à diversidade e por perceber que esse é um benefício inigualável para todos", ressalta.

Como resolver o problema?

Para aumentar a inserção desses profissionais no mercado de trabalho, é preciso pensar em ferramentas individuais, práticas organizacionais e na atuação do governo nesse processo.

"Estamos falando de sociedade. A população japonesa é envelhecida e o governo investiu na capacitação tecnológica dos mais velhos", destaca Tonelli.

Em relação às empresas, o ideal é avançar de modo geral na capacitação do profissional, dando um olhar diferenciado para aquele indivíduo mais velho.

Além disso, mudar a forma de como aquele candidato pode ser aproveitado para determinada função, é extremamente importante.

"Vamos precisar conviver com novas formas de trabalho e posições que privilegiam os diferenciais que a idade traz", diz Sérgio Serapião, co-fundador e CEO da Labora.

Ele explica que em setores de varejo, é muito difícil aproveitar uma pessoa 50+ em posições que a deixem muito tempo em pé. O ideal é que seja uma posição positiva para que possa extrair o melhor daquele candidato.

Para Serapião, é necessário ainda que as empresas mudem suas dinâmicas para conseguirem se tornar mais plurais. Pensar em mudanças significativas faz toda a diferença, segundo ele.

"O mais importante é o formato de trabalho. É fundamental pensar em jornadas curtas, que tenham um equilíbrio entre o trabalho e a saúde", afirma.

Por último, é preciso ter ações individuais. O profissional precisa estudar, buscar avanços e seguir na busca por emprego.

O ideal é fazer isso da maneira tradicional, e também procurar ajuda de empresas especializadas nesse tipo de recolocação de pessoas mais velhas.  BBC BRASIL

Professor Edgar Bom Jardim - PE